Herdeiro não é sinônimo de sucessor
- Rose Giacomin
- 2 de jan. de 2020
- 3 min de leitura
A sucessão costuma ser um dos momentos mais delicados nas empresas familiares. E este assunto exige ainda mais atenção nos negócios gerenciados pelos fundadores.

O principal problema relacionado com a sucessão é a ausência de um adequado planejamento sucessório, decorrente da dificuldade que a maioria das pessoas tem em abordar este assunto, já que, erroneamente, associam a sucessão empresarial com a morte.
Ressalte-se que esta associação é equivocada e não deve ocorrer. O principal motivo desta conexão indevida é o fato da palavra sucessão ser utilizado em duas situações distintas: a sucessão patrimonial e a sucessão empresarial.
A sucessão patrimonial, também conhecida como herança, é o patrimônio transmitido em virtude do falecimento de alguém, e encontra-se devidamente regulamenta no Código Civil Brasileiro com o título Direito das Sucessões. Conforme dispõe a legislação brasileira, somente existe herança quando ocorrer o falecimento de alguém, portanto, a associação da sucessão à morte acaba sendo inevitável.
No entanto, a mesma expressão “sucessão” pode ser utilizada em outro sentido, como na sucessão empresarial, que não deve ter nenhuma associação com o falecimento. A sucessão patrimonial é a substituição de uma pessoa em determinado cargo ou função.
Para facilitar a compreensão, são incontáveis as substituição de profissionais que ocorrem sem a necessidade de ter ocorrido o falecimento: diariamente milhares de funcionários são contratados para desempenhar as funções de empregados dispensados. Esses casos são de sucessão, ou sejam de substituição de uma pessoa em determinado cargo. No entanto, apesar deste exemplo evidenciar que a sucessão empresarial não deve estar associada ao falecimento, não são essas substituições de funcionários (ou sucessões) que causam preocupação nas empresas familiares, mas sim a sucessão do principal executivo, muitas vezes o próprio fundador.
E a grande dificuldade que surge é a indisposição, tanto do fundador como dos seus familiares, em abordar este assunto, já que, equivocadamente, associam a sua sucessão com o falecimento.
Considera-se, na análise deste artigo, a integração do sucessor e sua afinidade no seguimento do negócio jurídico, em paralelo com a economia, administração de empresa e contabilidade, não sendo função exclusivamente jurisdicional, mas de quem suportar o encargo da sucessão.
Urge salientar que a função de uma sociedade é norteada por princípios fundamentais vigentes, como o de preservação da empresa. A sociedade se reveste como instituição estruturada para a produção e a circulação de bens e serviços, admitindo ou não o lucro, o que será questionado à luz de outros princípios constitucionais, em detrimento de valores éticos que tenham por escopo a valorização da dignidade da pessoa humana.
A análise foi realizada no âmbito do Direito Empresarial, notadamente em relação às sociedades por quotas de responsabilidade limitada, nas quais, não havendo no contrato social previsão de falecimento do sócio e substituição de um sucessor para integrar a sua quota social.
A sociedade limitada poderá ser administrada pelos herdeiros do sócio falecido, se estes assim o quiserem, mesmo se tratando de uma faculdade, estará implícita a continuação da sociedade limitada.
Tem-se a possibilidade de que, com base no princípio da preservação da empresa e da presunção hominis ou facti, este último decorrente das regras de experiência comum, os futuros sócios herdeiros legítimos poderão participar da sociedade limitada, estabelecendo seu destino, em lugar do sócio falecido, podendo administrar a sociedade ao lado dos consócios remanescentes.
Considerando tal possibilidade, os herdeiros serão integrados como sócios, poderão prosseguir com os negócios e, em comum acordo, poderão partilhar suas quotas, evitando possíveis litígios e dissolução da sociedade, saindo da posição precária de meros administradores para tornarem-se sócios quotistas.
A tendência predominante dos tribunais, com base nos fatos esposados, é decidir pela continuidade da sociedade da forma mais ampla possível. Perceber esse ponto de partida é refletir sobre o desafio do herdeiro em administrar com a razão, prestando contas corretamente e mantendo uma unidade familiar.
Já o direito pessoal é relativo à condição de sócio, ou seja, o status socii, considerado um conjunto complexo de direitos e obrigações, podendo estas últimas ser de ordem econômica ou social.
Com efeito, existe a possibilidade de influência deixada pelo sócio falecido e o sucessor encontrar dificuldade no exercício de suas atividades na sociedade, seja por desvio de poder ou pela absoluta falta de affectio societatis com os consócios remanescentes.
Sobre os autores:
* Pedro Podboi Adachi é sócio diretor da Societàs Consultoria, especialista em empresas familiares, atuando como consultor de empresas, professor universitário e autor de diversos artigos, pesquisas e livros sobre o tema.
* Rose Giacomin é advogada, escritora, professora e consultora empresarial. Autora de diversos artigos e livros. Como função social da carreira colabora como: «membro da Asociación Argentina de Justicia Constitucional; «membro do Instituto de Estudios Politicos y del Estado; « Editor-chefe da Revista da Academia Brasileira de Direito Civil; « Membro do comitê avaliativo da Revista Síntese em Direito Empresarial da IOB e « Membro do Conselho Empresarial de Educação da ACMINAS.
E-mail: diretorjuridico@rosegiacomin.com.br
Kommentare